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  • Foto do escritorMariléia Sell

O triunfo da mediocridade

Em um franco movimento de desvalorização da intelectualidade pelo governo brasileiro, vemos, na contramão do progresso da humanidade, triunfarem as mediocridades. Na esteira da tragédia, temos um ministro da educação que, além de não ser professor e de não ter sido, tampouco, aluno notável, sangra as universidades públicas com um corte de 30% das verbas, convergindo com a ideia de que se produz muito conhecimento inútil, sem retornos concretos aos contribuintes, como é o caso das ciências humanas, notadamente a sociologia e a filosofia. Precisamos mesmo é de um povo que saiba ler, escrever, fazer cálculos e estar empregável, nada de fazer balbúrdias em universidades públicas. Precisamos também vigiar os professores e as professoras, com licença para filmar suas ações doutrinárias em sala de aula.


Arte: Daniel Cunha

Temos, também, um ministro do meio ambiente que é contra leis de proteção ambiental. Um ministro das relações exteriores que odeia os vizinhos latinos. Uma ministra da agricultura que aprova o uso desenfreado de agrotóxicos. Uma ministra dos direitos humanos que é contra os humanos ‘não direitos’, incluindo aqui toda a comunidade LGBTQ e as mulheres que não performam as identidades de gênero validadas pelas sagradas escrituras. Um ministro da justiça que prega a licença para matar, além de, é claro, aplicar uma justiça caolha, encabeçando uma cruzada patética contra a corrupção que só é válida para o telhado do vizinho. Um ministro da economia que quer fazer economia às custas dos trabalhadores para economizar bilhões para os ricos.

Mas, como a imoralidade parece ter perdido de vez a vergonha na cara, temos ainda o fato de o presidente da república brasileira ter concedido a mais distinta condecoração do Itamaraty, a Ordem Nacional de Rio Branco, aos seus filhos Flávio e Eduardo Bolsonaro. Também a concedeu ao guru da família, Olavo de Carvalho. Essa condecoração é atribuída a personalidades pelos seus serviços à nação ou por seus méritos excepcionais. A premiação palaciana representa uma inversão quixotesca da ordem das coisas, pois celebra a estupidez e humilha a quem, de fato, contribui para o progresso do país, como é o caso dos professores e dos cientistas.

Em uma postagem da UFCSPA, de Porto Alegre, sobre os cortes das verbas e os impactos dessa decisão daqui pra frente, uma ex-aluna se posicionou favorável às medidas porque, segundo ela, as salas de aula não precisam de ar condicionado e os pátios podem muito bem viver sem jardinagem. Ela considera um desperdício do dinheiro público investir em ambientes agradáveis e belos nas instituições de ensino. Ela não enxerga como a estética pode contribuir para a educação. Para ela, os prédios devem ofertar ambientes austeros e econômicos. Fico pensando se para essa cidadã a mesma lógica se aplicaria aos bancos, mesmo aos públicos, por exemplo. Será que ela questionaria o ar condicionado, a mesa com tampo de mármore, a cadeira estofada, a melhor internet e o guarda na porta de uma instituição financeira? Dificilmente. É por que a educação sempre foi a prima pobre, aquela que precisa mendigar recursos porque, afinal, a sua utilidade é sempre tão questionável, tão abstrata, tão inalcançável e, quase sempre, tão indesejável.

Não é à toa que é na educação que esse governo quer fazer economia. Não é à toa que os professores são alçados ao status de inimigos da nação. Por mais que a estupidez seja homenageada, este governo não é ignorante ao ponto de negligenciar o poder da educação. Esse governo sabe que só a educação pode livrar um país de governantes como eles. Enquanto triunfam as nulidades, como diria Rui Barbosa, a descrença no futuro só aumenta, como aumenta, também, a apatia coletiva. E é assim, exatamente assim, que o mal se instala, de deforma insidiosa, capilarizada e subterrânea.

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